"O meu pai costumava dizer que eu tinha inventado os dias de 36 horas", diz o Dr. Nirmal Shah enquanto solta uma gargalhada. E quando eu vos contar o que ele conseguiu ao longo da sua carreira, vão ficar a pensar nisso. O Dr. Shah é Diretor Executivo da Nature Seychelles, uma organização sem fins lucrativos dedicada à conservação da biodiversidade. Comercialmente astuto, estratega e extremamente focado, decidiu usar a sua considerável capacidade intelectual (e física!) ao serviço do futuro da sua querida terra natal.
No entanto, uma coisa é nascer nas Seychelles, e outra completamente diferente é ser filho de um dos mais célebres eruditos da ilha. Desde muito jovem, o Dr. Shah esteve rodeado de pessoas fascinantes oriundas de várias partes do mundo que procuravam a companhia do seu pai. Um empresário de sucesso, era também historiador, conservacionista, especialista em folclore, fitoterapeuta, fotógrafo talentoso e "colecionador de objetos relacionados com as Seychelles — antiguidades, mobiliário e muitos outros", lembra. "A minha mãe morreu quando eu era muito jovem. Por isso, cresci com ele numa casa que era basicamente uma biblioteca e um museu."
Embora a perda da mãe tenha sido muito difícil para ele e para o pai, a infância do Dr. Shah foi especial e muito feliz. Com uma bagagem de conhecimentos e histórias de "intelectuais, aventureiros e cientistas" que acompanhava em passeios de barco e caminhadas nas montanhas, foi memorizando os nomes científicos de animais, plantas, pássaros e vida marinha. "Quem me conhece sabe que tenho todos esses nomes memorizados, não os aprendi na universidade. Aprendi durante a adolescência."
Quando decidiu prosseguir os estudos, seguiu o conselho do pai e foi para a Índia seguir estudos empresariais e economia. Pode parecer uma escolha pouco comum para um adolescente que se sente tão absorvido pela natureza à sua volta, mas acabou por ser uma base sólida para as realidades financeiras e de recursos que são necessárias para administrar uma ONG (Organização Não Governamental). Isso também o aproximou das suas origens, já que nasceu nas Seychelles e é filho de pais com origem indiana – o seu avô veio da Índia para as Seychelles como comerciante em 1891. Mas não podia negar que o seu primeiro amor foi a ciência e que não iria ser capaz de iniciar os estudos de pós-graduação em contabilidade, em vez disso, decidiu partir para os EUA. Sentiu que a sua vocação era a biologia marinha. E, depois disso, tirou o doutoramento em ecologia pela Universidade do Texas.
Basicamente, a determinação e a paixão são os cartões de visita do Dr. Shah. É um homem que quase respira a informação, processa-a e depois aplica os conhecimentos que foi acumulando para resolver os problemas que mais o preocupam. Nada parece abalá-lo. Antes pelo contrário, é lúcido e prático. E é assim que encara todos os desafios, quer seja querer estudar um assunto completamente novo num mestrado ("com uma licenciatura em estudos empresariais, tive que me esforçar muito para entrar na área das ciências"), quer seja ser pioneiro em projetos de restauro de recifes de corais quando a maioria do mundo estava cética quanto à sua eficácia.
"Voltei para casa com esses diplomas de grau elevado", diz ele com naturalidade. "Naquela altura, não havia muitas pessoas nas Seychelles com um doutoramento, e ninguém das áreas do meio ambiente ou das ciências marinhas." Depois disso, trabalhou com o Ministério da Agricultura e com as Autoridades Piscatórias e, por fim, foi convidado a integrar o Departamento do Meio Ambiente como primeiro Diretor de Conservação e dos Parques Nacionais das Seychelles. Foi aí que se sentiu realizado. "Foi extremamente difícil começar do zero e, três anos depois, o nosso primeiro Plano de Gestão Ambiental estava a ser apoiado pelo Banco Mundial, pela UNESCO e pelo PNUA. Precisávamos do apoio de consultorias, mas não havia nenhuma. Então, decidi ir para o setor privado."
Tal como o seu pai fez antes dele, a mudança do Dr. Shah para a consultoria significou que também ele teve de criar uma enorme biblioteca. "A Internet ainda não tinha chegado às Seychelles. Então, juntei uma enorme coleção de livros muito caros sobre diversos assuntos relacionados com o meio ambiente. Trabalhava 24 horas por dia, 7 dias por semana, em cerca de trinta projetos diferentes. Foi nessa época que a BirdLife International se interessou particularmente pelas Seychelles, procurando fazer uma parceria que desse continuidade ao trabalho que tinha sido começado em 1968 quando a Ilha Cousin foi comprada para salvar aquela que era, na altura, a ave mais rara do mundo, a toutinegra das Seychelles. Queriam uma ONG local alinhada com os princípios da BirdLife International para tentar salvar o pássaro shama-oriental das Seychelles que estava em vias de extinção. O projeto seria financiado pela RSPB, e foi pedido ao Dr. Shah que criasse e administrasse esse mesmo projeto.
Mal sabiam que a "BirdLife Seychelles" (que, graças a muitos grandes pedidos de financiamento por parte do Dr. Shah, salvou algumas das aves mais raras do mundo nas Seychelles) iria transformar-se numa organização que ele descreve como tendo uma "visão ao nível do ecossistema". Assim nasceu a Nature Seychelles e, com a expansão do seu âmbito de atuação, surgiram novas fontes de financiamento que permitiram que o Dr. Shah e a sua equipa tivessem liberdade para trabalhar em projetos que realmente transformassem a ilha, incluindo o restauro de recifes de coral que nós e os nossos parceiros da Coral Spawning International estamos agora a apoiar. "É uma parceria incrível", afirma o Dr. Shah. "Estamos sempre à procura de ideias diferentes, pensamentos diferentes, tecnologias diferentes, e é raro encontrar uma colaboração como esta."
Obviamente, o seu pai estava a brincar quando disse orgulhosamente que o filho tinha inventado o dia de 36 horas, mas isso mostra bem a forma como o Dr. Shah, segundo o próprio admite, se entrega de corpo e alma à conservação das Seychelles. O seu trabalho traz-lhe uma profunda sensação de realização, mas é também o lugar onde se sente mais à vontade. A sua família também partilha o mesmo amor pelas ilhas e isso fá-lo sentir-se mais jovem, deixando-o preparado para o próximo desafio. "Sentar-me na praia a observar as aves marinhas a pescar à minha frente", diz ele, "esvazia a minha mente o suficiente para começar algo novo". E, em cada novo projeto, continua a manter a sua terra natal segura e, por sua vez, a manter seguras todas as nossas terras natais.
Saiba mais sobre a nossa parceria com a Coral Spawning International e a Nature Seychelles.
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